Provavelmente já notaste que a maioria das pessoas é crítica em relação ao estado da sociedade. Se calhar também te apercebes que, apesar disso, poucos fazem algo para mudar o que as rodeia. Muitos sentem-se avassalados pelos problemas e desistem antes de começar. Uma minoria avança, mas rapidamente se sente exausta e desmotivada. E a maioria, apesar de rodeada de gente, sente aquela solidão que só se extingue quando alguém não só está ao nosso lado, como está realmente ligado a nós.
Pode parecer uma situação difícil de explicar: porque é que tanta gente que se sente mal não se junta e procura a mudança?
Na verdade é simples. Quando nos sentimos mal, tendemos a isolar-nos e a confiar menos nos outros. Quanto mais tristes, deprimidos ou ansiosos nos encontramos, mais provável é que consideremos os outros como uma ameaça e não como um recurso.
O que acontece quando a maioria das pessoas se sente assim? Não é preciso imaginar, basta olhar à volta.
Quando nos sentimos isolados e tristes, o medo prevalece e altera a nossa forma de tomar decisões. Quando temos medo, focamos-nos em voltar a sentir rapidamente segurança, em vez de a procurar de forma sustentada. Pensamos a curto, ao invés de médio ou longo prazo.
As decisões políticas e sociais que assistimos nas notícias são uma prova disto mesmo. Soluções a curto prazo apenas para alguns, más soluções a longo prazo para a maioria. E violência…
Como se criam os ciclos de violência
A violência não nasce do nada. Funciona como uma doença contagiosa e hereditária – por isso tão difícil de erradicar -, propaga-se por ciclos, gerando interminavelmente mais violência. Basta pensar no que sentimos e como reagimos quando nos sentimos atacados: o coração acelera, a pressão sobe e a respiração torna-se rápida. Mesmo conseguindo disfarçar, um tremor interno dá-nos o sinal do perigo.
À medida que o espaço e tempo para nos ligarmos e nos sentirmos seguros, foi sendo ocupado por tarefas orientadas para o sucesso individual, as oportunidades para comunicar abertamente rareiam. A consequência, é tornamos-nos emocionalmente iletrados, impedindo a capacidade de expressar e aceitar as emoções de forma saudável, assim como de acolher o outro nos seus múltiplos estados emocionais.
Por não sabermos o que fazer essas manifestações emocionais, desvalorizamos e ignoramos as nossas necessidades emocionais e as dos outros. Elas ameaçam a nossa sensação de competência. Se não consigo compreender o outro, não consigo cooperar com ele, e nesse caso preciso de competir. Tenho de ser mais e melhor do que ele. Em vez de me sentir mais forte pela sua força, porque ele é um aliado, sinto-me ameaçada por ela, porque ele é um inimigo. A sua força ameaça-me. E a minha a ele.
A violência dos adultos projecta-se nas crianças, criando traumas cada vez mais precoces. Esses traumas funcionam como combustível a mais violência e mais trauma, criando ciclos crescentes e invisíveis. É o caso da desumanização que rodeia o nascimento e a morte. Demasiadas mães e bebés sofrem trauma no parto e saem da maternidade já com esse fardo. Demasiadas pessoas morrem sozinhas e sedadas.
A solidão e violência têm uma rede de consequências a nível individual e colectivo. A nível colectivo guerras, criminalidade, bullying, violência de género, doméstica, no desporto e no trabalho. A nível individual suicídio, depressão, adições, comportamentos de risco e insucesso escolar. É menos conhecida da maioria das pessoas a ligação comprovada à obesidade, tensão alta, diabetes tipo 2, cancro e doenças auto-imunes.
O trunfo na manga: transforma ciclos de violência em ciclos de empatia
O que temos a nosso favor? Somos programados para cooperar. Temos neurónios espelho que existem para que possamos sentir com o outro. São eles que nos levam a comover-nos tanto com a tristeza como com a alegria de conhecidos ou até estranhos. A empatia floresce quando nos sentimos seguros e incluídos. Neste caso o nosso impulso é cooperar e promover a felicidade e o bem estar à nossa volta.
Ao criar espaços seguros onde possamos conhecer-nos através das nossas diferentes histórias, ouvir ou ser ouvidos, podemos reconhecer no outro a nossa própria vulnerabilidade e também a força. Assim, tornam-se óbvias as necessidades emocionais comuns aos seres humanos.
À medida que reconhecemos a violência no dia a dia e o seu impacto em todos, sobretudo nas crianças, mulheres e idosos, a nossa educação emocional aumenta, e com ela a nossa capacidade de nos relacionarmos de forma empática e autêntica. Em conjunto, torna-se possível tomar medidas para interromper a transmissão transgeracional das atitudes violentas e prevenir os traumas precoces.
Quando conseguimos reagir apropriadamente à violência, com empatia e firmeza, criamos pontes entre as gerações, recuperando a integridade perdida do sistema social. A consequência será uma diminuição de todos os tipos de violência, da solidão e do stress e um aumento rápido e significativo do bem estar, pessoas com mais saúde integral, tanto física com mental e emocional.
Parece quase demasiado fácil que a solução seja reabilitar comunidades enfraquecidas e torná-las saudáveis e fortes. Mas não são sempre as melhores soluções as mais fáceis?